sexta-feira, 20 de agosto de 2010

O TEATRO E O ESPECTADOR NA CONTEMPORANEIDADE: da fragmentação à totalidade.

Para melhor representar a vida e as experiências propostas para o espectador, o teatro moderno, que surgiu na virada do século XIX para o XX, sofreu várias mudanças a fim de manter um diálogo com a sociedade.
A vida social contemporânea é marcada por várias transformações.  Estas podem ser percebidas a partir de uma infinidade de novos procedimentos espetaculares que dão um tom ficcional ao dia-a-dia e deixa a todos expostos a uma efervescência de informações que se renovam a todo o momento. A expansão dos meios de comunicação em massa, a multiplicação de máquinas e eventos, a criação constante de diferentes canais de aproximação, provocam no indivíduo contemporâneo sensações e estímulos diversos. Estimulam e interrompem raciocínios estabelecem alterações nos valores éticos e nos conceitos estéticos, requisitando assim novas maneiras de perceber e compreender os acontecimentos sociais.
As modificações no modo de vida na contemporaneidade e o sistema capitalista desenvolveram no indivíduo uma fragmentação onde este tem dificuldade de compreender a sua totalidade. Um ser dividido entre a razão e o sentimento.
Decorrentes de nossa sociedade industrial, as condições de mercado influenciaram o tipo de educação a que estamos submetidos, a qual contribui, sem constatação, para a formação desse tipo de pessoas, a que compartimentada, movimenta-se entre uma vida profissional e um cotidiano sensível, cotidiano para o qual parece não possuir o menor treinamento com base no desenvolvimento e refinamento de sua sensibilidade.(DUARTE JR., 2000, P.171)

Contextualizando o teatro e o espectador na contemporaneidade.

A pluralidade do modo de vida contemporâneo engendra profundas alterações nas relações econômicas, políticas e sociais, requisitando novos procedimentos estéticos para que se estabeleça um diálogo profícuo com os espectadores deste tempo.
A sensibilidade humana não é a mesma da modernidade, e por isso deve ser estimulada e atingida por novas propostas. As alterações no modo de vida trazidas pela contemporaneidade (como o desenvolvimento da televisão, a formulação de um novo pensamento cientifico...) colocam em xeque as propostas artísticas modernas e requisitam aos artistas novos procedimentos estéticos em acordo com a percepção e a sensibilidade do espectador dos dias atuais, que apresenta feições particulares.
A cultura pós-moderna expõe a crise, muitas certezas confortáveis, subvertendo as verdades do modernismo, do evolucionismo e até mesmo dos modelos críticos. As tendências artísticas recentes se utilizam dos novos media para instalar um produto cultural de fácil acesso, todavia há também por parte de produtores culturais a busca além de um modernismo, pela radicalização de suas negações de inteligibilidade imediata e da proposição autoral feita ao receptor, como evidencia Desgranges. (DESGRANGES, 2006, P.140)
 A arte moderna imbuída no espírito de participação em todas as instancias sociais, pretendia provocar o espectador, propondo-lhe que com senso crítico raciocinasse acerca da obra e organizasse interpretações autônomas sobre ela.
A arte contemporânea vai levar ao extremo está posição de autoria do espectador, sendo que este não apenas deve se encarregar de dar sua própria significação a obra como também participar da feitura da obra artística. A obra no moderno é aberta para que o espectador elabore outras montagens possíveis como no teatro épico brechtiano em que a interdependência dos elementos e a desconstrução da cena se tornam um bom exemplo da participação do espectador num mundo passível de transformação, em que este pode construir a obra teatral de outras maneiras para além da proposta. Já na contemporaneidade a idéia de abertura da obra vai além, para uma obra “explodida”, onde a realidade não se mostra mais desconstruída e transformável, mas sim uma realidade a ser concebida. Não existe mais uma obra, mas possíveis obras a serem construídas pelo receptor.
A arte teatral na contemporaneidade não é uma síntese aberta à conclusão, mas fragmentos que propõe uma atitude analítica ao espectador, não busca construir um consenso acerca da leitura do mundo, mas sim que o espectador contemple e analise a obra a partir de seu ponto de vista. A arte recente apresenta-se de forma desconexa, em justaposições de elementos que não se harmonizam, contraria a noção de organicidade do modernismo, em que as partes formavam um todo e esta disjunção das partes e a multiplicidade de estilos, propõe uma atitude criativa ao interlocutor.
Com a multiplicidade de estilos em que se utilizam elementos de todas as épocas, diferentes textos, diferentes narrativas desencontradas, propõe-se criar uma tensão entre os vários pedaços da obra, sem a preocupação de criar uma unidade, nem torná-la orgânica, fazendo com a compreensão se dê pela diferenciação, o espectador tendo que relacionar as partes entre pedaços que não se encaixam.  Há uma mistura de linguagens e narrativas, momentos que podem variar entre o épico, o lírico e o dramático, onde a os elementos que compõem a cena não trabalham mais em função do drama, de sua evolução e dos embates psicológicos de personagens, os elementos ganham significação própria, se manifestam com autonomia em que a encenação é um multifacetado jogo de linguagem que convida o espectador a criar histórias, formular analises críticas e até mesmo conceber o personagem.
 O teatro contemporâneo é propositalmente um processo inconcluso que suscita ao espectador através de uma ação artística na formulação de elementos de significação inexistentes e análises pessoais a cerca do discurso cênico, a juntar-se aos artistas para a feitura da obra e sua leitura. É a proposição dialógica com a efetiva participação do receptor enquanto co-autor da obra que determina o caráter estético, reflexivo e educacional da experiência artística.
O teatro moderno tem como uma das características importantes o fato de incitar ao espectador uma participação co-autoral do espetáculo em uma atitude responsiva as questões apresentadas pelo autor. O teatro contemporâneo pretende ir além quando faz com que o espectador utilize dos elementos levados a cena para formular uma concepção própria para o evento artístico, não apenas que fechando a obra numa elaboração responsiva, mas sim, participando ao acrescentar significantes ao jogo de linguagens apresentadas.
O teatro que procura uma reflexão por parte do espectador tem que estar em consonância com as alterações no modo de vida contemporâneo, a fim de estabelecer um diálogo profícuo com este indivíduo contemporâneo, estando imerso numa overdose de informação se encontra sedado; o teatro serviria para despertar, tendo que provocar este indivíduo a elaborar leituras próprias e estimulando a capacidade inventiva propiciaria a imaginação.
            Após a elucidação sobre teatro contemporâneo e do individuo na contemporaneidade posso concluir que o teatro tem um importante papel na proposição de que o sujeito dos dias atuais saia da sua passividade de mero observador do mundo que contempla para tornar-se um ser ativo na realização da obra artística e na sociedade. 

Artigo escrito por Diana Paiva (Assistente de Direção da Companhia) 

Referencias Bibliográficas:
AMORIM, Verussi Melo de  and  CASTANHO, Maria Eugênia. Por uma educação estética na formação universitária de docentes. Educação & Sociedade. [online]. 2008

Disponível no site: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S010173302008000400011&script=sci_arttext
(acesso em: 30 / 06 / 2009)

Desgranges, Flávio. A pedagogia do teatro: provocação e dialogismo. São Paulo: Hucitec: Mandacaru, 2006.

Duarte– Jr. João-Francisco. O sentido dos sentidos: A educação (do) sensível. Campinas, Universidade Estadual de Campinas/ Faculdade de Educação: 2000. Tese de doutorado. Orientação: Prof. Dr. João Francisco Regis de Moraes.

FREDERICO, Celso. Cotidiano e arte em Lukács. Estudos avançados [online]. 2000..

(acesso em: 30 / 06 / 2009)

Monteiro, Paulo Filipe. Os outros da Arte. Universidade Nova de Lisboa, Celta: 1996.

Zibermam, Regina. Estética da Recepção e História da literatura. São Paulo, Ática: 1989.

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